Dance como se ninguém estivesse vendo
Cante como se ninguém estivesse ouvindo
E beba como se fosse o último dia de sua vida

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Alimentando a hidra

Ao intercambiar epístolas imediatas com a Diva, a chama da esperança do Equilibrista foi reacendida: a amiga, com sua profunda sabedoria, forneceu combinações numéricas necessárias para estabelecer interfaces auditivas com dois provedores de fluido de alimentação para hidras de bunsen. Como o horário estava muito avançado, o bardo resolveu esperar até o dia seguinte para trocar o cilindro bojudo vazio por um cheio, mesmo sendo o serviço dos provedores, supostamente, de prontidão permanente.

Resolveu que não iria à sua guilda tradicional naquele dia de Odin, pois chegaria muito atrasado. Então decidiu aproveitar para dar um basta àquela situação precária de retrocesso ao período anterior à descoberta do fogo em que seu reduto se encontrava. Tentou contatar um dos provedores indicados pela amiga. Inseriu o código numérico em seu dispositivo fixo de interface auditiva, mas a solicitação de conexão não foi interceptada pelo outro lado. Experimentou o número alternativo para o mesmo provedor, mas esse não era válido. O Equilibrista estava achando que, por se tratar de um número emergencial, não havia contingente para atender um pedido em horários normais. Como não pretendia esperar até um horário menos propício para transações comerciais, inseriu o código do outro provedor. A interface foi estabelecida com sucesso, mas, ao especificar o tipo de cilindro que necessitava, foi informado de que este não estava disponível para sua área de atendimento. O aventureiro só não se entregou ao desespero por possuir o código de um provedor que não ficava de prontidão permanente, mas que não seria convocado, em represália ao seu horário restrito de funcionamento, mas não havia alternativa. Foi estabelecida uma interface e feito o pedido.

O Equilibrista tinha
em suas mãos, finalmente, um cilindro cheio do fluido combustível. No entanto, quando foi conectá-lo à sua hidra de bunsen, percebeu claramente que havia uma falha na vedação, tanto pelo audição, como pelo olfato. peça danificadaApós várias tentativas frustradas de alimentar sua hidra hermeticamente, o já intoxicado bardo decidiu que precisava adquirir uma nova peça de conexão. Partiu atordoado de seu reduto e, com muito custo, conseguiu encontrar um item semelhante. A peça danificada possuía prolongamentos que facilitavam sua fixação ao cilindro bojudo, mas a nova era sextavada, exigindo, portanto, para instalá-la, o uso de um instrumento altamente complexo, ferramenta ictióideque se assemelhava a um peixe pré-histórico habitante de fossas abissais.

A peça substituta foi posicionada no soquete e, com o instrumento ictióide, foi sendo fixada pelo bardo, que começou a ouvir o ruído característico de fluido liquefeito sob alta pressão sendo liberado. Presumiu que devia se tratar de uma condição intermediária e que, na posição definitva, a liberação cessaria, mas não foi o que aconteceu: ao girar a peça mais algumas vezes, um jato do fluido se projetou vigorosamente para fora do cilindro, na direção do rosto do Equilibrista. peça sextavada instaladaNesse momento, o fluxo do tempo desacelerou, e o incauto aventureiro viu aquele cone nebuloso se formando e se aproximando, então, com uma reação extemamente rápida, fechou seus olhos e inclinou a cabeça para trás, enquanto afrouxava a peça para interromper o jato, que fez contato refrescante (mas fétido) com sua pele.

De rosto devidamente lavado, o Equilibrista indagou-se se seria necessário devolver a peça. Mas a preguiça de sair novamente de seu reduto fê-lo tentar novamente, mas, daquela vez, encaixando o sifão de alimentação da hidra na peça de conexão para depois fixar o conjunto ao cilindro. E funcionou! Nenhum vazamento foi detectado pela visão (com a técnica da aplicação de tensoativo líquido), pelo olfato ou pela audição. O Equilibrista (já com cefalgia decorrente da inalação contínua a propano e butano) conseguira, finalmente, recuperar a habilidade de usar o presente de Prometeu para preparar seus mantimentos.

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terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Distância asséptica

O Equilibrista estava aguardando, em um alinhamento de seres com objetivo em comum, para entrar no salão de reposição nutricional de sua guilda tradicional, quando reparou que o indivíduo imediatamente à sua frente era adepto de uma tendência de que estava em voga na época: a de deixar longas madeixas queratinosas com aparência de rolos de fumo embolorado. Para evitar qualquer tipo de contaminação, o asseado bardo manteve uma certa distância daqueles meios de cultura bacterianos.

Logo na entrada do salão, havia uma cuba para higienização das mãos que, surpreendentemente foi utilizada por aquele ser de aparência não muito asséptica. O Equilibrista assistiu atentamente ao ritual de limpeza (afinal, o processo estava retardando seu avanço): o indivíduo começou satisfatoriamente, friccionando as mãos sob o solvente universal corrente com um pouco de tensoativo líquido, enxaguando-as e enxugando-as. Porém, ao finalizar o processo, tudo foi por água abaixo: talvez fosse um arco reflexo, ou algum tipo de condicionamento, mas complementou a secagem das mãos na parte traseira de suas vestimentas, bem no local em que os grandes glúteos se apóiam quando se senta. O Equilibrista achou prudente continuar mantendo distância.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

Da Gula para a Ira

Toda aquela atmosfera pesada e desânimo do Equilibrista eram um prelúdio de uma tragédia que se aproximava: na noite daquele fatídico dia dedicado ao Sol, o fluido de alimentação da hidra de bunsen bicéfala do bardo se esgotou, impossibilitando-o de preparar quaisquer mantimentos que necessitassem de ativação ou transformação térmica. Felizmente já havia feito seu repasto noturno, mas a preocupação era a noite do dia seguinte.

Aquele ciclo lunar iniciou-se com bastante labuta. O Equilibrista se animara para dar andamento àquelas tarefas atrasadas no mesmo dia em que estava excessivamente indolente (o sentimento de culpa foi substituído pelo do dever), o que ajudou bastante a adiantar o processo naquele dia dedicado a Selene, mas ainda não foi capaz de finalizar a missão, mesmo dedicando-se tanto a ponto de renunciar ao seu respasto do zênite solar.

Frustrado, cansado e com fome, o bardo tentou adquirir um cilindro bojudo de fluido inflamável assim que chegou ao seu reduto, mas o fornecedor do item não recebeu a interface auditiva, provavelmente em decorrência do horário superior ao das transações comerciais convencionais. Como estava faminto, o Equilibrista lançou mão do recurso de conjuração de discos de massa cobertos de leite coalhado e maturado. E pôs-se a esperar pela chegada do alimento. E continuou esperando. E esperou mais um pouco. Até que, um ciclo e meio do relógio após o ritual de conjuração, se cansou, e a gula deu lugar à ira. Pensou em estabelecer uma interface auditiva com os provedores do disco e instruí-los a introduzi-lo em seus vasos traseiros (vasos traseiros: expressão descoberta pelo Antimacrobioto e divulgada pela Diva), mas decidiu resfriar seu ânimo com uma sessão de precipitação artificial de chuva aquecida, após a qual, saiu à caça de nutrientes.

Saciado e mais calmo, o Equilibrista foi recepcionado em seu reduto por uma chamada auditiva. Eram os provedores de discos de massa querendo saber se o bardo ainda estaria interessado no item conjurado, pois um entregador não havia sido capaz de localizar o conjurador. Os provedores foram bastante afortunados, pois o estado de humor do aventureiro estava muito melhor, o que o impediu de proferir os diversos impropérios que povoaram sua mente no momento de ira.


Para finalizar aquele ritual de conjuração mal-sucedido, o bardo tratou de eliminar os pergaminhos com referências àqueles provedores para garantir que nunca mais fossem utilizados.

domingo, 28 de janeiro de 2007

A indolência e a culpa

O dia dedicado ao Sol amanheceu cinzento e com vapor condensado caindo do céu, mas o calor na Cidadela-Capital continuava. Então, sabiamente, o Equilibrista escolheu um desjejum bastante refrescante: cubos de espuma gelada revestidos de chocolate.

Aquela dose matinal de serotonina não foi suficiente para anular a indolência contínua do bardo e nem mesmo o Sol, que surgiu entre as nuvens, conseguiu tirá-lo do marasmo e do seu cárcere voluntário. Algo estava faltando naquele dia. Provavelmente eram muitas coisas.

Uma delas era, com certeza, disposição para finalizar algumas tarefas (muito atrasadas) referentes à sua guilda tradicional. E a culpa de não estar mergulhado no trabalho interferia intensamente em qualquer outra atividade.

Seria falta da companhia dos amigos? Possivelmente. Mas, naquele dia, pretendia ficar ali no seu reduto, isolado, pois era restringido pela preguiça e pela culpa.

Poderia estar carente de nutrientes, mas isso foi sanado rapidamente após o repasto zenital (ratificando: zenital!). Felizmente, a letargia característica do período pós-prandial não se manifestou com muita intensidade, ou as horas que restavam do último dia daquele ciclo lunar seriam sacrificadas a Hypnos.

Sem mais nada de útil (ou que estivesse com disposição) para fazer, o Equilibrista pôs-se a escrever suas crônicas, quando, subitamente, decidiu que deixaria a culpa de lado e, sem sair de seu reduto (pois a indolência continuava), estouraria grãos de milho e assistiria a uma aventura dramatizada longa digitalizada.

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sábado, 27 de janeiro de 2007

Uma receita da Diva

A Cidadela-Capital estava sendo assolada por constantes ondas de elevada entalpia desde seu aniversário de fundação. Essa condição de alta temperatura favorecia sobremaneira um comportamento indolente do pacato Equilibrista, que, aproveitando-se desses dois fatores - "dia quente e preguiçoso" - resolveu testar, naquele ensolarado dia de Saturno, uma receita divulgada por sua amiga Diva.

O tranqüilo bardo começou a separar os ingredientes, quando se deu conta de que não dispunha de manjericão. Obviamente, o calor e a preguiça não o deixaram sequer cogitar deixar seu reduto em busca das verdes folhas aromáticas. Também estava sem dentes de alho e pensou em substituir as sugestões apimentadas da Diva por um pouco de pó para chili, mas decidiu que não precisava de outro estímulo para fazê-lo suar e que o prato seria mais refrescante do que picante.

Enquanto picava os rubros frutos ricos em licopeno, lembrou-se de um acontecimento recente, quando pretendia saborear um dos mantimentos trazidos pelas irmãs de seu progenitor: um caldo de feijão negro com proteínas animais diversas, e, para acompanhá-lo, precisaria fazer um vinagrete. Então, depois de fracionar o fruto rubro em cubos e adicionar sal, cebola, pimenta, vinagre e azeite, viu que a mistura estava relativamente seca. Estabeleceu uma interface auditiva com sua progenitora para indagar se havia necessidade de adicionar água ao acompanhamento. A experiente alquimista culinária explicou pacientemente para seu aprendiz que a presença do sal faria com que o fruto liberasse líquido. O filho estava cético, mas respeitou a sabedoria materna e ficou observando o recipiente com a mistura. Foi então que líquido começou a surgir no fundo da cuia de vidro! O Equilibrista estava estupefato. Era o milagre da hidrogênese!

Com a consciência de volta ao contínuo temporal em que seu corpo físico se encontrava, o bardo terminou o fracionamento dos tomates e adicionou sal e pôs-se a observar, novamente, aquela água brotar do nada. Acrescentou os demais ingredientes e deixou aquela mistura vermelha descansando e liberando mais líquido, enquanto amolecia faixas helicoidais de massa em água fervente. Quando ficaram prontas, o Equilibrista, lembrando-se das instruções da amiga, descartou rapidamente a água e juntou a massa ainda quente aos cubos vermelhos e suculentos, que teriam seu licopeno ativado pela elevação da temperatura. O prato para dias quentes e preguiçosos ficara pronto.
Foi uma experiência gustativa fantástica, que poderia ter sido ainda melhor com alho e manjericão. Então, naquele dia quente, o Equilibrista continuava preguiçoso, mas também estava satisfeito com o repasto e muito grato à sua amiga, que compartilhava seus profundos conhecimentos, principalmente os culinários.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Comendo curry com calor

Na manhã do dia em que se comemorou o quadringentésimo quinquagésimo terceiro ano da fundação da Cidadela-Capital, o Equilibrista acordou disposto a reduzir um pouco o caos instaurado em seu reduto.

Começou tornando seu móvel estofado catalisador de letargia um local com lugares disponíveis para se sentar, mas isso comprometeu a possibilidade de utilizar parte de seu leito. Depois começou a eliminar material particulado de móveis, do assoalho e de objetos diversos, principalmente dos seus adornos metamorfoseáveis tão desejados pela Diva.

Aproveitou para utilizar um dos itens que recebeu das irmãs de seu progenitor: uma película polimérica impermeável para cobrir seu sustentador retangular de objetos. A diferença visual era quase imperceptível, pois a película era transparente, mas a praticidade seria enorme, visto que acidentes com líquidos coloridos em cima do sustentador (que eram freqüentes) não obrigariam a troca imediata do tecido que o cobria.

Acomodou vários dos novos utensílios em compartimentos no laboratório de alquimia culinária e outros no interior de um armário, mas foi necessária uma nova configuração dos itens previamente ali alocados (desde então, era necessário abrir as portas do armário com a maior cautela, a fim de evitar um colapso da estrutura interna, cujo equilíbrio era muito instável).

Toda essa atividade em nome da ordem deixou o Equilibrista cansado e entediado, e o aventureiro resolveu descansar. Foi quando estabeleceu uma interface auditiva com o Urso Maior, que propôs fazerem seu repasto do zênite solar juntos naquele feriado, pois queria muito saborear um prato picante indiano niponizado e um estabelecimento provedor dessa iguaria muito apreciado por ambos ficava próximo ao reduto do bardo. Sem hesitar, o Equilibrista aceitou o convite e continuou descansando.

O dia estava quente, e houve precipitação pluvial efêmera, e o Sol voltou a brilhar, e o Urso Maior anunciou sua chegada, e o Equilibrista deixou sua morada.

Encontraram-se na caverna de transportes subterrâneos mais próxima do Equilibrista, que controlava sua irritação por estar enfrentando aquela multidão de transeuntes sem destino e sem pressa para poderem alcançar o estabelecimento-alvo.

A dupla chegou, fez seu pedido e se regozijou com aquele fascinante prato de aroma e sabor bastante peculiares. Essa iguaria tinha a característica de estimular as glândulas sudoríparas. O alto nível de entalpia ambiente naquele dia, também. Caso o aventureiro, cujas referidas glândulas não são nem um pouco indolentes, não tivesse pedido água gelada gaseificada em detrimento da sua tradicional infusão de ervas, provavelmente seria acometido de uma desidratação severa.

Os dois amigos conversaram animadamente durante a refeição, sendo o assunto principal os vários temperos dos diversos acompanhamentos servidos e, como ambos não tinham outros planos para aquele dia ocioso, o Equilibrista sugeriu que se deslocassem para seu reduto, onde continuaram conversando e se divertindo até o dia terminar.

quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

URYAAAAAAAAH!

Duas irmãs do progenitor do Equilibrista e duas filhas de uma delas viriam à Cidadela-Capital naquele dia dedicado ao Sol. As filhas eram Violeta e Mariposa Ígnea. A última iria fazer uma apresentação de movimentos rítmicos de estilo nipônico em uma base de operações de colonos de origem comum ao estilo muito próxima ao reduto do Equilibrista.

Aproveitando essa localização estratégica, as visitantes vieram munidas de vários mantimentos e utensílios para o bardo, com o objetivo principal de dar a este, melhores condições para aprimorar suas técnicas em alquimia culinária. O plano para aquisição dos utensílios foi encabeçado pela tia que visitou o reduto do Equilibrista na ocasião do rito de aquisição do grau de sacerdotisa de Têmis pela Absorta, e contou com a adesão de algumas de suas irmãs. Obviamente, quem teve que carregar todos esses itens foi o próprio beneficiado. Felizmente a distância entre a arca terrestre que transportou todo aquele volume e a torre do bardo era mínima. Os mantimentos foram acomodados, em sua maioria, na câmara extratora de entalpia sem muita dificuldade, mas os utensílios eram tão numerosos que o Equilibrista levaria várias rotações para organizá-los (não se sabia se concluiria tal tarefa algum dia).

A hora da apresentação da Mariposa Ígnea se aproximava e toda a comitiva já estava na base de operações, assistindo aos outros números. Foi impossível não notar a empolgação de um ancião que estava na primeira fila de espectadores que, ao invés de saudar as dançarinas com palmas, soltava um grito ininteligível, que mais parecia um insulto a cada uma que subia no palco, embora sua intenção fosse exatamente o oposto. Foram apresentadas várias danças, sendo o tema mais comum a paixão proibida de uma profissional oriental de entretenimento individual. O que mais divertido e irônico (pelo menos para o Equilibrista) era a idade média das senhoras que encarnavam as belas e graciosas personagens. Foram raros os casos em que os rostos da dançarina e da protagonista combinavam, sendo o da Mariposa Ígnea uma dessas exceções. Suas duas performances foram excelentes, e seu talento já era bastante conhecido na esfera dos praticantes e apreciadores dos movimentos rítmicos de estilo nipônico.

Depois das suas apresentações, a Mariposa Ígnea aproveitou-se da proximidade do reduto do seu primo para utilizar o precipitador articial de chuva aquecida do local e tirar todo o pó alvo de seu rosto de maneira eficiente. Também teve a oportunidade de ver sua própria performance, pois o Equilibrista registrara suas apresentações através do Aço Negro. Infelizmente sua diversão foi interrompida, pois a arca terrestre que a troxera estava de partida e ela era a única que ainda não havia embarcado.

O Equilibrista acompanhou sua prima até o transporte e despediu-se das visitantes. Então voltou ao seu reduto e continuou a organizar os presentes
que ganhara naquele dia.

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A estação de diversão

continuação de Musse de lichia

Quando não havia mais luz do Sol no céu, o Equilibrista partiu para a morada de Daeva, levando consigo um recipiente contendo a musse de lichia, que acabara de ter seu retículo protéico consolidado pela baixa temperatura, e outro menor, com o mesmo conteúdo, separado especialmente para a Rainha Mestiça.

Quando finalmente chegou ao seu destino, o bardo teve que aguardar um pouco para que fosse recepcionado. Daeva logo explicou o motivo da morosidade: estavam todos ocupados e concentrados com um desafio virtual proposto por uma estação de diversão de segunda geração. A tal estação era propriedade da unigênita do Cartomante, mas estava temporariamente confiscada pelo pai. Além da anfitriã e anfitrião-proprietário-interino-da-estação, estavam se divertindo a Leitora Pretérita e Emotivo.

Antes dos cumprimentos, o Equilibrista acomodou o doce na câmara extratora de entalpia local, pois o retículo protéico da musse estava se desfazendo com o calor. Depois dos cumprimentos, Daeva preparou sua nova poção etílica: uma bebida diminuta da zona rural bastante exótica, que levava na sua composição: tangerina, fermentado nipônico de arroz, sacarose finamente pulverizada, canela e pimenta vermelha. Mesmo necessitando de algum aprimoramento (o sabor da canela estava muito acentuado), a bebida foi bastante apreciada. A nota picante dada pela pimenta, misturada ao sabor refrescante da tangerina e à suavidade do fermentado nipônico, era surpreendentemente sublime. O Equilibrista já fazia notas mentais para registrar a receita em seu grimório.

Enquanto o Equilibrista apreciava o coquetel, o Cartomante enfrentava um desafio de coordenação, onde os sensores digitais da estação simulavam um violão elétrico. Tal desafio não chamou muito a atenção do bardo, que achou que aquela simulação seria bastante enfadonha, mesmo sendo ele o desafiante. Mas enganou-se. Quando chegou sua vez de confrontar a simulação, sentiu-se aprisionado naquele mundo virtual, como se a estação tivesse lançado mão da habilidade bárdica de cativar audiências. Mal podia esperar para que sua vez chegasse novamente.

Foi numa dessas lacunas em que o Equilibrista via-se livre da influência cativante que a Rainha Mestiça chegou. Foi recepcionada pela anfitriã e pelo bardo, recebeu as boas-vindas do Cartomante, mas demorou para que fosse cumprimentada pelos outros presentes, pois a Leitora Pretéria e o Emotivo estavam sob o domínio hipnótico da estação. A recém-chegada estava faminta, aflita para provar o tão desejado doce e ficou ligeiramente ofendida por ter disputado a atenção da dupla com uma máquina (e por ter perdido a contenda). Saciou sua fome com uma torta preparada pela Daeva, mas foi obrigada a esperar para poder degustar a musse.

A dupla que fez a Rainha Mestiça esperar logo teve que se retirar, permanecendo o quarteto da Alta Elite da END. O Leão Montanhês também fora convocado, mas não se manifestou nem compareceu.

Depois de muita insistência, a ansiosa amante de lichias conseguiu realizar seu desejo de saborear a tão aguardada musse, a qual não agradou o Cartomante, que indagou se a textura e o sabor do doce seriam semelhantes ao do fluido vetor de gametas masculinos. A Rainha Mestiça, com bastante convicção e propriedade, refutou a comparação, declarando que o doce era muito melhor, mas Daeva parecia discordar da amiga (esclarecimento: a anfitriã não gostou muito da musse. Esse foi o ponto da divergência).

Com os polegares esfolados após várias simulações de artes marcias, o grupo parou de enfrentar desafios gerados pela estação de diversão. Então o ritual de despedida foi realizado. A Rainha Mestiça, além de conduzir o Equilibrista, levaria o que restou da musse, uma vez que foi a única que (supostamente) maravilhou-se com a receita.

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quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Musse de lichia

Naquele dia de Freya, uma convocação foi enviada a alguns membros da END, principalmente para a sua Alta Elite. O comunicado partira de Daeva, que tencionava testar uma nova poção etílica em seus colegas de comunidade.

O Equilibrista, um dos convocados, ficou curioso quanto aos componentes da bebida, mas sua amiga se recusou a revelá-los. Então o instigante bardo declarou que levaria um doce exótico, incitando a curiosidade de Daeva, que, então, aceitou uma proposta de intercâmbio de informações (O Equilibrista ficava ligeiramente astuto quando o objetivo era obter esse tipo de informação). O aventureiro cumpriu sua parte do acordo, dizendo que iria preparar uma musse de lichia, pois desejava agradar a Rainha Mestiça, que também fora convocada.

Certa vez, trocando mensagens instantâneas com a Rainha Mestiça, descobriu que a amiga tinha uma certa atração irresistível a essa fruta de aparência cretácea. Quando o Equilibrista mencionou que tentaria fazer o referido doce, a discípula de Florence teve um surto nematelmíntico, quase deixando o amigo escrevendo mensagens sozinho para adquirir uma porção dessas frutas, mas conteve-se, com muito esforço.

Os ingredientes não eram muitos: fluido lácteo condensado; fluido lácteo gorduroso cremoso, lichias em calda; precursor de retículo protéico incolor e insípido; e solvente universal aquecido.

O preparo também era bastante simples: dissolver o precursor de retículo protéico no solvente universal e adicionar a solução e os demais ingredientes em um rearranjador mecânico de partículas até obter um creme homogêneo; e deixar a mistura resultante em uma câmara extratora de entalpia até o retículo protéico se formar e transformar o creme em uma massa consistente.

A Rainha Mestiça foi avisada de que o Equilibrista prepararia o prato para aquela reunião, o que praticamente obrigou-a a comparecer e deixou-a bastante exaltada.

continua

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terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Encontro de cronistas: Epílogo

continuação de Encontro de cronistas

O trio, satisfeito, alegre e triste (depois de se fartar com as iguarias nipônicas), partiu em direção ao reduto do Equilibrista. No caminho, o Antimacrobioto relatava algumas aventuras sino-gastronômicas, nas quais pratos deveras exóticos foram degustados. Essa narrativa, que seria breve, foi bastante prolongada devido a várias interrupções para o bardo indicar o caminho a ser seguido.

Chegaram à morada do Equilibrista, que ainda estava num estado caótico, mas já era possível encontrar um lugar para se sentar. O Antimacrobioto logo reparou em uma das particularidades do reduto do bardo: a vista. O anfitrião, com sua total falta de senso de direção, não sabia indicar os logradouros que serviriam de referência, mas a paisagem noturna era uma atração que falava por si mesma (pretexto padrão para justificar a ignorância do Equilibrista).

Tentativa da DivaEm seguida, Diva percebeu a existência de outra particularidade do reduto do Equilibrista: os adornos de tema... infantil. Esses adornos possuíam uma espécie de magnetismo, pois todos que os viam logo queriam tocá-los e metamorfoseá-los (sim, eram miniaturas mutantes de monstros digitais). A cronista escolheu um exemplar de extrema complexidade de transformação, então o Equilibrista ofereceu o esquema ilustrado para a operação, que foi prontamente recusado. O aventureiro havia iniciado a exibição de um dos títulos de crônicas animadas, que serviu apenas de fundo sonoro para o ambiente, uma vez que as atenções estavam concentradas na metamorfose do adorno. Depois de muitas tentativas, Diva conseguiu
(ou chegou muito perto de) completar o dificílimo quebra-cabeça.

Transformação corretaTransformação correta

Antimacrobioto estava acomodado no móvel estofado catalisador de letargia, que, no seu caso, acabou catalisando esternutações consecutivas. O desleixado anfitrião fez uma nota mental: "priorizar a eliminação de material particulado na sua próxima arrumação de emergência".

Como
todos estavam processando enormes quantidades de iguarias ingeridas, os ilustres visitantes não estavam dispostos a petiscarem, mas o Equilibrista não deixaria de apresentar-lhes, pelo menos, uma de suas poções etílicas. Como queria usar seu toróide alquímico, começou preparando um White Russian. Diva achou o teor alcoólico um pouco elevado. Então o Equilibrista fez uma nova nota mental: "reduzir a proporção do destilado do leste europeu". Uma única dose abasteceu o trio, pois Diva e Antimacrobioto recuperavam-se de um fim de semana dedicado a Dionísio e estavam restringindo tanto a ingestão de espíritos etílicos que recusaram um Mojito.

O Antimacrobioto revertera a transformação do segundo adorno vitimado pela Diva, e esta terminava de ver algumas ilustrações do Equilibrista, quando decidiram despedirem-se do anfitrião, que ainda apresentou seus ouriços estroboscópicos ao casal antes de acompanhá-los até a entrada da gôndola de deslocamento vertical.

Embora contente com a visita, o Equilibrista teria ficado muito mais feliz se tivesse servido seu polêmico Daikiri aos seus amigos, contudo, como já foi relatado, não encontrara o imprescindível grenadine. Mas ainda haveria outras oportunidades.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Encontro de cronistas

continuação de Encontro de cronistas: Prólogo

O local em que o Equilibrista se contraria com seus amigos era seu estabelecimento favorito para consumo de iguarias nipônicas esteticamente preparadas e dispostas, instalado no primeiro piso de uma pequena torre que reunia outros provedores de iguarias, todos baseados na culinária oriental. Subindo as escadas, foi surpreendido pelas portas fechadas do ponto de encontro, mas o bardo ficou parcialmente aliviado ao ler o aviso de que o atendimento estava sendo feito no piso superior. Restava apenas saber se a equipe que cuidava do preparo das iguarias era aquela à qual estava acostumado. Não era. Mas entrou mesmo assim, pedindo uma mesa para três. O único rosto conhecido entre os funcionários era o da chefe de operações gerais, que cumprimentou o Equilibrista e indagou se as outras duas pessoas que chegariam eram as irmãs Vítima e Antares, companhias habituais do aventureiro naquele estabelecimento. Não eram.

"Enquanto isso os cronistas praguejavam contra a cidade, os carros e a chuva, pois estavam presos, sem conseguir ir para frente nem para tás, em meio ao trânsito dessa cidade maluca. Será que eles conseguiriam chegar sem causar ofensas profundas ao anfitrião, que, afinal de contas, morava ali do lado e já devia estar chegando no local combinado há tempos?"

Sentado, sozinho, o Equilibrista observava o estabelecimento lotar. Em outra época, já estaria salivando, necessitando de todo seu autocontrole para manter-se à mesa sem sucumbir à irresistível tentação de se servir, vendo todas aquelas pessoas desfilando com seus pratos abarrotados. Mas não naquele dia. Talvez fosse pelo ambiente estranho, ou pelo fato de passar por uma fase rubro-carnívora, ou por possuir maior controle sobre seus impulsos (hipótese menos provável). Não demorou muito para que o Antimacrobioto surgisse no portal de entrada. Avistou o Equilibrista e fez sinal para que a Diva entrasse. Cumprimentaram-se e começaram a conversar, enquanto esperavam o alinhamento de seres com objetivo de capturar as iguarias expostas diminuir. As infusões de folhas e os tecidos escaldantes enrolados (miniaturizados) já haviam chegado quando o trio se levantou para servir-se.

A disputa para conseguir algumas iguarias específicas era ferrenha. Diva e Antimacrobioto apreciavam os órgãos extraídos de um equinodermo eunuco (na verdade, o animal se tornaria eunuco depois da extração do órgão), assim como grande parte dos outros comensais presentes, então foi muito raro adquirirem esse item. O Equilibrista, na intenção de auxiliá-los nessa dificílima tarefa, tentou lançar mão de seu prestígio perante a chefe de operações do estabelecimento. Mas foi frustrado pela explicação de que os encarregados pelo prepraro daquelas obras de arte comestíveis estavam deveras assoberbados, não podendo atender pedidos individuais. O pobre bardo percebeu que sua longa ausência afetara significativamente seu prestígio.

O trio continuou conversando. Foram relatatadas várias mudanças que ocorreram nas comunidades do plano virtual, a compulsão do Antimacrobioto por assistir a uma saga ininterruptamente, a façanha da Diva ao assistir outra, algumas alianças feitas pelo Equilibrista. Então o aventureiro viu algo que fez seu sangue gelar: uma porção daqueles disputados órgãos do pobre equinodermo sendo levada a uma mesa. Ao invés de manter essa humilhação apenas para si mesmo, o bardo revelou-a aos seus amigos, que não foram muito solidários à sua dor.

Em algumas ocasiões, Diva sacava seu pergaminho para registrar algumas inspirações que tinha. Não poderia se esperar menos de uma cronista de tão alto nível.

O tempo passava, os ocupantes das outras mesas já não eram mais os mesmo, e os três amigos continuavam ali, contando seus feitos, degustando itens multicoloridos e se divertindo. Quando estavam mais do que satisfeitos, incapazes de alocar mais alimento em seu celoma, os outrora tão disputados órgãos de equinodermos passaram a se acumular na bancada. Antimacrobioto formulou a hipótese de que a nova geração de comensais, por ser composta majoritariamente de humanos do oeste, não apreciava o sabor exótico daqueles animais. Mesmo com a abundância daquelas iguarias, o trio resolveu finalizar a noite (naquele estabelecimento) com frutas (afinal, para sobremesa sempre há mais espaço).

continua

quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Encontro de cronistas: Prólogo

Naquele dia dedicado a Odin, o Equilibrista receberia a visita de um ilustre casal de amigos em seu reduto após um repasto noturno com eles. Utilizando-se do fato como pretexto, deixou sua guilda tradicional mais cedo, pois precisava adquirir grenadine, uma vez que era seu intento preparar seu veneno vermelho.

Chegando ao seu fornecedor de espíritos etílicos (e afins: o grenadine era um xarope não alcoólico), o bardo recebeu a triste notícia de que o imprescindível ingrediente acabara. Perguntou sobre a disponibilidade de alguma Weiß, e a resposta foi, novamente, negativa.

Fazendo um exercício mental de consulta ao seu grimório etílico, o Equilibrista lembrou-se de duas opções: White Russian e Mojito. As partes etílicas estavam disponíveis em seu reduto, faltando apenas três ingredientes simples. Embarcou em uma arca terrestre que o levou até um estabelecimento varejista de alimentos. O bardo nunca foi conhecido por sua capacidade de estimar corretamente quantidades de porções alimentares, mas naquela dia, seu erro de cálculo se deu antes mesmo das primeiras equações (na verdade, estava sendo levado por um certo impulso consumista). Além dos elementos básicos para os dois coquetéis que tinha em mente, muniu-se de alguns mantimentos para servirem de acompanhamento, e de mais alguns que poderiam, por ventura, ser úteis. O desatento aventureiro apenas se esquecera de que seus amigos fariam a visita APÓS uma refeição e de que a referida refeição seria muito farta.

Depois de muito esperar pela acomodação de suas aquisições em invólucros poliméricos (o responsável pela operação teve a capacidade de colocar cada item em um invólucro diferente), o Equilibrista deixou o estabelecimento extremamente carregado (enquanto o correto seria portar apenas três ingredientes para o preparo das duas bebidas). Normalmente faria o trajeto caminhando, mas o peso era, realmente, extremamente excessivo, o que levou o aventureiro a embrenhar-se numa caverna de transportes subterrâneos e transpor apenas um único ponto de transição.

Com muito esforço, muitas calorias a menos e vários músculos exercitados, o bardo chegou em sua morada. Esta necessitava de uma arrumação urgente, pois no estado em que se encontrava, mal havia espaço para uma pessoa sentar-se. Então arrumou seu leito, tirou vários objetos de cima do móvel estofado catalisador de letargia, removeu crostas fossilizadas de sua hidra de Bunsen bicéfala e trocou o tecido de cobertura de seu sustentador retangular de objetos.

Estava quase na hora combinada e ainda havia muitas arrumações para serem feitas, então o Equilibrista foi obrigado a se conformar com o caos remanescente e estava saindo de seu reduto, quando recebeu um projétil submarino comunicador avisando que seus amigos se atrasariam um pouco. Aproveitou-se desse tempo extra para cuidar de mais alguns detalhes e pôs-se a caminho do local onde se encontrariam.

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terça-feira, 16 de janeiro de 2007

Não verás nada!

Há algumas noites, os progenitores do Equilibrista estabeleceram uma interface auditiva com o filho, pois estavam preocupados com seu bem-estar, uma vez que haviam quebrado uma grande superfície refletora e repetiram o feito logo após a substituição do mesmo. Na noite anterior ocorrera a queda do leito. Deveria estar claro que algum acontecimento (suposta e normalmente) chocante estava prestes a acontecer com o bardo (que não fora soterrado na grande cratera que surgira na Cidadela-Capital).

Sem suspeitar de sua sorte, o Equilibrista, feliz com o recente retorno de Aço Negro, embarcou na arca terrestre que o levaria à sua guilda tradicional, localizada próxima à grande cratera. Sentou-se, como de costume, no último assento do transporte e ouvia tranqüilamente cantigas nipônicas digitalizadas que seu dispositivo móvel de comunicação descompilava em decibéis.

O veículo aproximava-se de um templo de louvor ao consumismo quando um passageiro adjacente, de estatura muito elevada e epiderme extremamente ebânea, perguntou sussurrando se o bardo fazia parte da tropa de oficiais da lei. Surpreso com a pergunta e distraído como sempre, o Equilibrista negou. Então, seu vizinho mostrou sua real intenção: ordenou que o bardo mostrasse seu dispositivo de comunicação. O fato, obviamente, despertou a indignação do Equilibrista que, simplesmente recusou-se em um tom elevado, lançando um olhar furioso ao perpretador. Então, o maior infrator mostrou um disparador de projéteis e perguntou àquele pequeno e ousado ser que o fitava encolerizado se estava certo do que respondera.

Fez-se a típica cena em que o mundo parava. Enquanto faíscas saltavam de seus olhos, o Equilibrista considerava diversos fatores e seus pesos: acabara de reaver seu precioso Aço Negro; um meliante ocioso o ameaçava, querendo separá-los novamente; esse larápio portava uma arma de fogo; o bardo não sabia se era autêntica ou um facsímile fajuto; o infrator não estava com o dedo no gatilho. Na verdade, nem o mundo, muito menos o tempo haviam parado, tanto que o bandido tornou a perguntar ao Equilibrista se estava certo sobre o que havia respondido. Então o sangue do bardo ferveu e, mais uma vez, o mundo parou. Em meio à ebulição, várias possibilidades: não sabia se extraía a traquéia do elemento com as próprias mãos (apenas mão direita, mais precisamente), se entregava seu pressssssscioso Aço Negro, ou se gritava denunciando o ladrão. O mundo saiu de sua estase e o aventureiro foi o primeiro a se mover: ergueu-se e encarou o patife de uma posição superior. Surpreendido, o malfeitor também se levantou e, acuado, pôs-se na direção da saída e fez sinal para que o Equilisbrista não fizesse alarde. O bardo continuava encarando-o e decidiu que era melhor consentir do que causar pânico entre os outros passageiros.

O transgressor deixou a arca, descendo em frente ao templo do consumismo e o Equilibrista seguiu seu caminho, indagando-se se não deveria ter denunciado o marginal. Comunicou o ocorrido ao seu amigo Urso Maior, que repreendeu o imprudente aventureiro pela loucura que havia cometido. Mas o Sol resplandecia, o criminoso estava impune e o Equilibrista nem chocado ficara.

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segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

A dura realidade

O Equilibrista viu-se num vasto aposento, ocultando-se sob o estrado de um leito que não era o seu. Então, pelo véu que nublava sua visão e pela situação absurda em que se encontrava, concluiu que estava nos domínios de Morpheu, dentro do reino de Hypnos.

Percebendo a presença de um vulto que aparentemente sondava o cômodo, o bardo esgueirou-se como um ofídio na direção de outro leito que também não era o seu. De repente, o solo onírico desapareceu sob seu ventre e, depois de uma breve queda, despertou ao som do impacto de seu corpo com o solo material. A dura realidade fazia-se sentir em seu cotovelo e joelho e trazia os outros sentidos do Equilibrista, além do tato, de volta para ela. Finalmente se deu conta de que estava ao lado do leito que era o seu, no entanto, infelizmente, fora dele.

Aproveitando-se do fato de estar desperto, o Equilibrista resolveu eliminar excedentes líquidos, porém, por ter sido trazido ao plano material tão abruptamente, o aventureiro e seu espírito ainda não estavam completamente unidos, o que atrasava significativamente suas sinapses. Na posição em que se encontrava, o percurso até a área de eliminação seria menor, mas suas sandálias encontravam-se do outro lado de sua cama. Então rolou por cima deste, calçou as sandálias e tentou alcançar seu intento, mas deparou-se com um grande obstáculo: uma almofada cilíndrica, com a largura de seu leito estava caída à sua frente e seu pé, calçado, estava na iminência de pisar nela e assim, sujá-la. O Equilibrista tentou desviar a perna, mas com as sinapses lentas, seu membro inferior respondeu de maneira pouco satisfatória ao comando cerebral pisando em... nada! nem no próprio solo. Resultado: um novo encontro com a dura realidade, que se manifestou, desta vez, como a parede que veio de encontro ao rosto do bardo.

Naquele momento, a nova dor terminou de unir o Equilibrista e seu espírito, que resolveram mudar os planos: ao invés de eliminar líquido, encheram um invólucro polimérico com água sólida e líquida e voltaram para a cama, promovento bastante contato entre o osso zigomático atingido e a bolsa gelada improvisada, permanecendo assim por meio ciclo do relógio, quando atreveram-se a entrar nos domínios de Hypnos mais uma vez.

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Aço Negro retorna

Aço Negro, o poderoso dispositivo móvel de interface auditiva do Equilibrista, estava prestes a completar seu primeiro ano quando seu proprietário resolveu deixá-lo aos cuidados de um ferreiro eletrônico para que alguns reparos fossem efetuados.

Foi durante a comemoração natal da Vítima no último ano do cão, em meio a uma conversa com a Tecnocrata, Defensora (outrora R.P.) e seu par, Mecatrônico, que o bardo se convenceu da necessidade de sanar um grande problema de seu disponsitivo: a
enorme dificuldade em abrir o compartimento de sua célula de energia. A Tecnocrata conseguiu realizar essa tarefa hercúlea uma vez, mas quando a platéia pediu uma nova demonstração, o feito não se repetiu. O Equilibrista passou o restante do evento tentando remover a então inviolável proteção do coração de seu dispositivo, ao fim do qual, o aventureiro estava suado; seus dedos, esfolados e suas unhas, gastas; mas todo seu esforço fora em vão.

A célula de energia devia ser removida para que outro componente pudesse ser retirado: a alma rígida do Aço Negro, pois esta não poderia estar presente durante a operação de evolução das funções do aparelho. Essa evolução corrigiria algumas falhas comportamentais e despertaria algumas capacidades latentes, que o Equilibrista havia observado na Primogênita, dispositivo idêntico da Tecnocrata.

O Equilibrista seguiu várias pistas e indicações até encontrar uma grande torre na qual se localizava um ferreiro eletrônico autorizado a manipular seu dispositivo e, depois de enfrentar um enorme e vagaroso alinhamento de seres com objetivo em comum, pôde explicar o problema a uma assistente do ferreiro. Havia necessidade de deixar Aço Negro aos cuidados daqueles profissionais e, segundo as regras destes, o alma rígida do aparelho deveria permanecer com o proprietário do mesmo. Então o bardo assistiu à franzina assistente tentar remover a carapaça do dispositivo. Derrotada, a atendente pediu licença e entrou em uma câmara isolada. O Equilibrista temeu pela integridade física do seu artefato, mas a moça retornou toda sorridente, com o Aço Negro em uma mão e sua alma rígida na outra. E essa foi a última vez que o aventureiro viu seu inseparável dispositivo móvel naquela translação solar.

A falta que o Aço Negro fazia era indescritível, principalmente em ocasiões como a última viagem do Equilibrista à sua cidadela natal, quando algo que o isolasse acusticamente do ambiente era quase uma necessidade vital. Outro fator insuportavelmente incômodo era a constante sensação da falta de conexão com seus companheiros de aventura (no entanto, essa falta se mostrou bastante útil em algumas ocasiões, principalmente para despistar seus superiores hierárquicos), mas graças ao seu bom amigo, o Urso Maior, que lhe emprestou um dispositivo móvel para abrigar a alma rígida de Aço Negro provisoriamente, esse fator foi minimizado.

O pobre Equilibrista aguardou, desolado, carente, ansioso, durante dois ciclos lunares e meio (dos quais, durante um ciclo e meio, estabeleceu interfaces auditivas diariamente, tanto com os criadores do aparelho quanto com as assistentes do ferreiro), quando finalmente recebeu a notícia de que um novo Aço Negro havia sido disponibilizado e aguardava para ser retirado. Foi um dia de festa, de alegria! Mesmo sendo outro corpo, o genótipo era o mesmo e a alma, também. Todos os problemas antigos desapareceram e a evolução funcional pôde ser feita.

domingo, 14 de janeiro de 2007

A caridade da Rainha Mestiça

continuação de Ficando com um desconhecido

A alvorada se aproximava e muitos dos ocupantes decidiram encerrar sua estada naquele estabelecimento, fazendo com que o grupo dos seis cansados aventureiros fosse obrigado a enfrentar um alinhamento em coluna única de seres com objetivo em comum (no caso, pagar pelos itens consumidos e deixar o local). E eis que, novamente, o fenômeno se repetia: mesmo estando ali, de pé, parados, a aniversariante e seus amigos viam-se dando passagem a transeuntes, agora não tão perdidos, pois o gurpo encontrava-se próximo à área de eliminação de excedentes metabólicos e havia razão para as pessoas passarem por ali. Uma explicação para esse fato recorrente poderia ser que as emanações cármicas combinadas do sexteto conjurassem um efeito túnel (ou seria falta de sorte mesmo).

Mas o efeito túnel não foi o único fenômeno a se repetir: o ousado desconhecido surgiu mais uma vez, tomando a Rainha Mestiça em seus braços. A Espanhola identificou o ser não-identificado como sendo o mesmo que tentou flertar com ela e então gesticulou sinais de purificação. O Equilibrista podia ver claramente a expressão entediada da amiga aniversariante e comentou-a com a Invulnerável, que, mesmo assim, ainda insistia que as mulheres sabiam como repelir companhias que não as agradassem (o assunto já fora tratado entre os dois durantes as divagações na mesa), mas o bardo não estava convencido e torcia para que não houvesse mais um membro para acompanhá-los ao destino final da noite.

Já do lado de fora, o sexteto (para alívio do Equilibrista) combinava a formação da comitiva, ficando decidido que cada carruagem seguiria independentemente da outra até o próximo ponto de encontro: um estabelecimento especializado em pão prensado com embutido vermelho.

Dividiram-se em trios: o Cartomante, Daeva e Espanhola em uma carruagem e Rainha Mestiça, Invulnerável e o Equilibrista em outra.

Aproveitando a presença de um dos assuntos da divagação com a Invulnerável, o bardo resolveu esclarecer sua dúvida: afinal, a aniversariante estava apreciando ou não a presença bastante próxima daquele desconhecido? Então "o assunto" deu início ao seu relato. Alegou que o desconhecido não era esteticamente repulsivo, parentava uma idade não muito discrepante com a sua (a idade média dos ocupantes do estabelecimento era bastante elevada) e não pertencia ao grupo importuno dos desfavorecidos de Athena (ela teve a precaução de averiguar essa associação), então resolveu permitir a aproximação do intruso. Mas, quando intercambiaram ptialina, a Rainha Mestiça se decepcionou sobremaneira com a performance do rufião, mas ficou com receio de repeli-lo e magoar seus sentimentos, então ficou martirizando-se ao prolongar a companhia, além de tudo, enfadonha e persistente do inexperiente e incompetente desconhecido (esse cronista já foi mais discreto...). O relato da aniversariante desbancou a teoria da Invulnerável.

O trio da aniversariante acabou desviando-se da rota, o que atrasou sua chegada ao ponto de encontro. Mas quando finalmente alcançaram seu destino, não localizaram o outro trio, que surgiu logo em seguida, reclamando do desvio do primeiro. Novamente reunido, o sexteto garantiu uma mesa para acomodá-los, deixando o Cartomante marcando o território (com sua presença, sem uso de outras técnicas de demarcação), enquanto os demais tratariam de conseguir a comida.

Depois de muita luta, a aniversariante e seus amigos conseguiram seus pães prensados com embutido vermelho e foram juntar-se ao amigo vigilante, e surpreenderam-se ao vê-lo negociar adornos cervicais estrangulantes com um ancião em trajes sociais àquela hora anterior à alvorada! Mas a técnica de negociação de ambos também foi impressionante: o simpático ancião fez uma oferta, com o acerto em parcelas; o Cartomante pediu um desconto de 10 unidades monetárias em cada uma; o ancião fez um breve discurso e aumentou a oferta inicial em 10 unidades(!); e o Cartomante fechou negócio(!!!).

Alimentados, porém, fatigados e sonolentos, o sexteto se despediu, sendo a Rainha Mestiça novamente felicitada por seus amigos, pela aquisição de mais um ano de experiência.

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sábado, 13 de janeiro de 2007

Ficando com um desconhecido

continuação de Banda de anciões

Espanhola e o Equilibrista, não querendo mais testemunhar os gritos dos desfavorecidos de Athena e aproveitando a volta das seqüências de cantigas semi-automáticas, deixaram a mesa e dirigiram-se para a área de movimentação rítmica, mas pararam no meio do percurso, pois encontraram um local mais confortável do que a pista abarrotada. Não demorou muito para os demais membros do grupo se juntarem à dupla e então, novamente, o sexteto passou a ser interrompido por transeuntes nômades e indecisos que iam e voltavam a toda hora. Haveria alguma explicação para tal fenômeno? Ainda não possuíam informações suficientes para formular uma teoria.

Súbito, a atmosfera ficou empesteada pelo odor característico de feromônios fermentados. O grupo já fora vítima dessa terrível arma biológica naquela noite, enquanto sofria ao som da banda de anciões. Com esse novo ataque, o Equilibrista pôde identificar o marsupial perpetrador. O indivíduo estava bem atrás da Espanhola e, aparentemente, tinha intenções de abordá-la, mas a suposta tentativa foi totalmente frustrada pelo bardo, que começou a reclamar, em voz bastante alta, da fragrância fétida que todos estavam sentindo, obrigando o portador daquelas glândulas sudoríparas hiperativas a se afastar.

Com a atmosfera menos poluída, o rendimento dos seres aeróbios aumentava, mas o nível de energia da aniversariante estava baixando, enquanto o de seus convidados ainda era suficiente para mantê-los com movimentos rítmicos. Então a Rainha Mestiça resolveu sentar-se, o que deu a oportunidade para um ser não-identificado iniciar uma investida. O Equilibrista ficou de prontidão para repelir a aproximação, mas sua amiga parecia estar disposta a dar uma chance ao desconhecido. Mal o bardo se afastara e o repentino casal já estava intercambiando ptialina (algo que o retrógrado aventureiro não compreendia muito bem era esse pseudo-rito de acasalamento praticado pelas gerações mais jovens, feito de forma fugaz e, por vezes, anonimamente).

O estoque energético do restante do grupo, exceto o da Espanhola, se exauriu, o que os levou a sentarem-se também, mas a algumas mesas de distância da Rainha Mestiça e seu par. A animada dançarina era a única que permanecia de pé e a mover-se ao som das cantigas, enquanto o restante divagava. A aniversariante juntou-se ao grupo depois de um certo tempo (não muito longo) e continuaram com a divagação. Espanhola continuava dançando, quando foi abordada por um ser não-identificado, que foi logo dispensado por ela. O Equilibrista, atento ao ocorrido, achou estranho e melhor comentar com a incansável dançarina a grande semelhança entre o rufião recusado por ela e o aceito pela Rainha Mestiça. Espanhola mostrou-se surpresa, pois não prestara atenção às feições do repentino e efêmero par da aniversariante, e disse que seria muita ousadia do desconhecido aproximar-se de duas integrantes de um mesmo grupo, caso se confirmasse a suspeita do atento guardião das beldades do grupo.

Quando todos ficaram fatigados, resolveram partir para o desfecho daquela agradabilíssima noite de comemoração, tendo o local derradeiro sido decidido durante as divagações. Mas, antes, era necessário quitar a somatória dos itens consumidos.

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sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

Banda de anciões

continuação de Daikiri vs Daiquiri

O animado sexteto procurava seu lugar ao som em meio a golpes de ombros e glúteos dos que já haviam encontrado o seu. A comitiva finalmente parou quando seus seis integrantes verificaram que havia espaço suficiente para erguer os braços sem golpear ninguém. Era um local próximo ao tablado de apresentações, no qual um grupo de trovadores se apresentaria mais tarde, uma posição supostamente privilegiada.

Todos estavam bastante animados e moviam-se de acordo com os acordes tocados em caixas magnéticas vibratórias, mas um estranho fenômeno ocorria: não foram raras as vezes que o grupo foi obrigado parar e aguardar a passagem de algum transeunte à procura do seu lugar ao som. Alguns desses seres importunos passava pelos aventureiros para, segundos depois, fazer o trajeto inverso.

A disputa pelo centímetro quadro acirrava-se cada vez mais a cada ciclo do relógio que se passava e, então, Espanhola mostrou sua técnica da dança dos cotovelos em ângulo agudo. Era uma arte com muita graça e beleza, bastante eficaz tanto para a defesa quanto para o ataque. A concorrência por espaço aumentou ainda mais quando os trovadores, todos anciões, começaram a tocar. Depois de um início razoavelmente animado, a banda começou a demonstrar sua falta de carisma e de capacidade de cativar a audiência, mas a anivesariante e seus amigos não se deixaram abater. O agitado sexteto ainda prestigiou os músicos por algum tempo, permitiu a passagem de mais transeuntes perdidos e se encontrou com um outro convidado da Rainha Mestiça e seu acompanhante. O convidado recém-chegado parecia ser uma pessoa agradável, mas seu amigo era um verdadeiro receptáculo de vestimentas sem alça de formato esférico besuntado de banha (e ainda dava sinais de embriaguez).

Espanhola e o Equilibrista revoltaram-se com as cantigas desanimadas que estavam sendo interpretadas e foram para uma área menos abarrotada. Daeva e o Cartomante também deixaram a área de movimentação rítmica, sugeriram encontrar uma mesa disponível e o fizeram sem muita dificuldade. Logo os seis estavam sentados, mas não se viram livres dos incômodos: um grupo de tecno-aprendizes de uma escola sem muito prestígio bradava rimas de apologia à sua instituição incessantemente. Obviamente, esses seres que se humilhavam com sua constante exposição ao ridículo foram alvos de chistes e desprezo do culto e intolerante sexteto.

Ao longe ouviu-se anunciar a despedida da banda de anciôes e Espanhola e o Equilibrista se olharam mostrando um sorriso de satisfação.

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Daikiri vs Daiquiri

O dois milésimo sétimo ano do calendário gregoriano mal começara e uma nova comemoração havia sido marcada: a celebração natal da Rainha Mestiça. Este evento já estava se tornando uma tradição para a alta elite da END, sendo o terceiro ano consecutivo em que os membros da comunidade eram convidados. O local escolhido neste ano foi um estabelecimento especializado em ritmos frenéticos de décadas passadas, e a data coincidiria com a do nascimento da aniversariante.

Naquela agitada noite entre o dia de Vênus e o de Saturno, reuniram-se: a Rainha Mestiça; sua amiga, Invulnerável; o Cartomante; Daeva; Espanhola e o Equilibrista. Ao chegarem, a aniversariante e sua amiga ficaram receosas devido à baixa densidade demográfica na entrada (e também no interior), mas logo suas preocupações desapareceram, assim como os centímetros quadrados disponíveis.

Antes de partirem para a agitação rítmica dos membros, o grupo precisava de combustível, ou seja, de espíritos etílicos. Olhando o rol de opções da casa, o Equilibrista localizou uma que era sua especialidade: Daiquiri. Ignorou a atendente que foi à mesa anotar os pedidos e dirigiu-se ao balcão dos alquimistas etílicos, pois seu intuito era acompanhar todo o processo de preparo. Embora bastante atencioso, o alquimista da casa não seguiu o procedimento correto para fabricar o veneno vermelho: apenas agitou a mistura com um bastão ao invés de utilizar um toróide alquímico. Para piorar ainda mais, o ingrediente vermelho não era grenadine, mas xarope de groselha. O exigente bardo provou, sorriu e elogiou a mistura (fazendo uso do máximo de sua capacidade dramática), levando-a, em seguida, para ser degustada pelos demais membros do grupo. O veredito foi unânime: reprovado! Aqueles que conheciam o Daikiri do Equilibrista não deixaram de comentar
(nem podiam, pois o "modesto" aventureiro fez questão de perguntar a opinião de todos) que o do bardo era melhor.

O Cartomante abastecia-se com uma bebida diminuta da zona rural, Espanhola e Invulnerável preferiram um fermentado de cevada e a aniversariante sorvia, vagarosamente e com muito custo, uma mistura de frutas com teor alcoólico elevadíssimo e de sabor não muito agradável.

Constataram que a especialidade da casa não era o preparo de misturas etílicas. O Cartomante sugeriu que o grupo fosse para a área de movimentação rítmica, mas o Equilibrista protestou, dizendo que aguardava um refresco alcoólico. Então seu amigo carteador apontou para o lado do bardo, que se surpreendeu com a furtividade da atendente que deixara a bebida sem fazer-se notar.

Abastecido, o grupo partiu para a ação.

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quinta-feira, 11 de janeiro de 2007

Adeus, ano do cão

continuação de Cervejarium

No último dia do ano do cão, o Equilibrista foi trazido de volta do mundo de Hypnos da forma que mais o irritava: participando de um diálogo compulsório. Sua progenitora, provavelmente para redimir-se do abandono ao qual relegara seu filho no dia anterior, veio perguntar como havia sido a reunião, quais foram os participantes, qual o horário do término, entre outras futilidades. O bardo apenas balbuciava alguns monossílabos até que sua mãe se deu conta de que aquele colóquio não estava agradando seu filho.

Alguns ciclos do relógio depois, o Equilibrista finalmente retornou ao plano material por completo. Informou sua progenitora da visita que receberiam do Toreador, solicitando que ela confeccionasse alguns petiscos recheados de pescado norueguês desidratado. O pedido foi prontamente atendido (afinal, ela considerava-se em falta com seu primogênito).

O Toreador apareceu depois de um certo período de ansiedade (lembrança remota: o Equilibrista estava acostumado com essas longas esperas por seu amigo, mas antigamente, seu humor piorava consideravelmente, o que não ocorria mais àquela época) - a progenitora do Equilibrista chegou a sugerir que uma interface fosse estabelecida, mas o bardo preferiu confiar no grão-sacerdote de Têmis. Mais uma vez, o Toreador chegou na melhor hora possível: os petiscos acabavam de sair da frigideira. Conversaram bastante, mas talvez não o quanto desejavam, afinal a presença dos progenitores do Equilibrista inibia assuntos além dos triviais. Mesmo assim, o bardo estava contente com a visita do amigo, que, infelizmente foi bastante breve. Despediram-se firmando o compromisso de se encontrarem mais vezes durante ano do javali (que o Equilibrista se empenharia em cumprir).

Nem bem o Toreador partira e o intercomunicador anunciou a visita de um outro amigo: o Boina de Açafrão. Foi uma excelente surpresa para o Equilibrista e, principalmente para seus progenitores, que há muito não presenciavam essas pequenas reuniões em seus domínios. Seu amigo estava acompanhado da esposa e explicou a razão de não ter comparecido na noite anterior. Reforçou, também, a condição arredia de seu irmão, que não se animara para sair em nenhuma das ocasiões. A estada do casal foi ainda mais efêmera do que a do Toreador, mas ao se despedirem, a mãe do Equilibrista declarou, para total constangimento do bardo (o que estava demorando para acontecer), que ainda confundia os gêmeos.

E assim, mais uma translação chegava ao fim. O ano do cão, apesar de tempestuoso, teve um desfecho que deixou o aventureiro bastante feliz: o reencontro com seus caríssimos amigos da Confraria Eterna.

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quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

Cervejarium

continuação de Sozinho e ocioso

O horário combinado para a reunião chegara, mas os progenitores do Equilibrista ainda não. Como estes já estavam cientes do evento, o aventureiro não deixou nenhuma indicação de onde poderia ser encontrado (lembrança remota: isso já causou muito constrangimento em uma outra celebração) e pôs-se a aguardar o Alquimista Prolixo, que iria apanhá-lo em sua carruagem movida a combustão interna. Seu insano confrade chegou fazendo ruído com as rodas vulcanizadas e recebeu um silencioso olhar de reprovação do Equilibrista.

O Alquimista trazia sua companheira, Lírica, e aprensentou-a ao amigo. O trio seguiu seu caminho prozeando durante todo percurso (o que não poderia ser diferente com um Prolixo a bordo) e logo chegou ao seu destino: o Cervejarium (é bastante incomum o nome do próprio local ser indicado nessas crônicas, mas o nome dessa taverna já é, por si só, bastante incomum, interessante e apropriadíssimo). As prateleiras do estabelecimento ostentavam seu vasto repertório de fermentados maltados e alguns outros espíritos etílicos deslocados do contexto. O ambiente era bastante aconchegante, com aspecto rústico e despojado.

Os taberneiros receberam bem o grupo, cumprimentando o Alquimista Prolixo pelo nome, uma vez que este era um freqüentador assíduo, comparecendo em todos os dias dedicados a Selene. Essa notoriedade se mostraria bastante vantajosa durante todo o evento. Acomodaram-se e logo pediram dois copos de fermentado de trigo da casa (Lírica não apreciava esse tipo de bebida). O Equilibrista não achou ruim, mas declarou que o sabor precisava ser aperfeiçoado, pois não deixava o gosto residual característico das
Weiß.

Chegaram petiscos e um coquetel feito com fermentado de cevada como ingrediente principal. Essa bebida não constava no rol daquelas oferecidas pela taverna, mas era um segredo conhecido por um seleto grupo de fiéis à casa (1ª vantagem).

Um tipo de cerveja de alta fermentação raro naquela cidadela havia chegado recentemente, o que foi informado ao Alquimista Prolixo, que imediatamente pediu para serem colocados dois recipientes em adequação térmica (2ª vantagem).

Súbito, o dispositivo móvel de interface auditiva provisório (Aço Negro ainda estava em reparos) do Equilibrista anunciou uma chamada: era seu progenitor, indagando o paradeiro do grupo e avisando uma futura interface do Boina de Açafrão. Logo após finalizar a interface, a profecia se realizou: era seu amigo discípulo de Hipócrates desculpando-se por não poder comparecer. O bardo lamentou a ausência do confrade pedindo uma outra variedade de
Weiß: desta vez, de uma tradicional escola desse néctar turvo, mas que ainda não havia provado. Sublime! Deliciosa! Perfeita! Foram os três adjetivos que vieram à tona simultaneamente, como as bolhas que chegavam ao colarinho. Era uma experiência que merecia ser compartilhada com toda a confraria. O Equilibrista estava tão absorto absorvento aquele divino líquido dourado que nem percebeu a aproximação do Toreador, que veio desacompanhado de sua esposa. Chegara na melhor hora possível, tendo a oportunidade de provar a mãe de todas as Weiß.

O quarteto pestiscou, bebeu e conversou bastante, passando a revesar-se para aliviar o músculo liso voluntário do líquido em seu interior. Quando chegou a vez do bardo, que geralmente avalia o local para a necessária operação de eliminação do excedente líquido, surpreendeu-se sobremaneira ao vislumbrar a originalidade dos taberneiros para aromatizar aquele ambiente reservado. Realmente, tudo naquela taverna era peculiar. A idéia de usar rodelas de limão e cubos de água sólida era algo genial e divertido (pena que a água não permanecia sólida por muito tempo).

Então, depois de muito escutar o Prolixo Alquimista e de se divertir, o grupo resolveu encerrar a reunião, pedindo a somatória dos itens consumidos. A quantidade absurda de cortesias chegava a ser criminosa (3ª vantagem), e o Alquimista sentiu-se obrigado a pedir por uma elevação no valor da conta.

Como Toreador estava sozinho em sua carruagem, ofereceu-se para levar o Equilibrista até a torre do clã. Durante o trajeto aproveitaram para conversar um pouco mais, o que ocasionou um novo convite: no dia seguinte, último antes do término da translação do cão, o jurisconsulto faria uma visita ao bardo, que prometeu reservar um pouco de
pudim para seu amigo.

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Sozinho e ocioso

continuação de Raro entre raridades

O dia do reencontro dos velhos amigos não tardara a chegar (afinal, havia sido combinado na noite anterior) e, logo pela manhã, o Equilibrista encontrava-se sozinho na torre de seus progenitores. Ambos haviam saído para auxiliar na confecção de esferas comestíveis de arroz sovado, que seriam ingeridas na comemoração do início do ano do javali, pois, segundo ensinamentos do império do sol nascente, tal prática atraía boa ventura. Passou a maior parte do dia sozinho, mas fizera uma visita às irmãs de seu progenitor, convenientemente no horário do repasto do zênite solar. Os homens de seu clã eram bastante afortunados, pois as mulheres eram exímias alquimistas culinárias.

Nutrido e satisfeito, o aventureiro aguarvada pelo contato de um d'Os Gêmeos. Como estava no mais puro ócio, resolveu ocupar seu tempo tomando a iniciativa, tentando estabelecer uma interface auditiva. Sucesso! O mais velho dos irmãos, o Boina de Açafrão, atendeu e confirmou sua presença, mas não garantiu a de seu irmão, Arremessador, pois este encontrava-se arredio, lembrando muito as fases misantrópicas do Equilibrista.

Cronos favorecia o bardo naquele dia, pois a noite chegou com presteza, anunciando a iminência do encontro, que se daria dois ciclos do relógio após o crepúsculo.

continua

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